SER IGREJA
EM QUE MEDIDA?
Embora muitos cristãos não participem da Igreja, ser cristão implica necessariamente tornar-se membro da Igreja. Isso vale para qualquer denominação cristã, mas vamos aqui abordar especificamente a questão do ponto de vista da Igreja Católica.
É normal, ao menos no Brasil, que as pessoas que foram batizadas na Igreja Católica se digam católicas, a não ser que tenham mudado de denominação ou religião. Isso significa que o “ser católico” tem um sentido bastante amplo.
Como se sabe a Igreja se constitui e constrói em volta da ceia eucarística. Isso não é apenas uma afirmação teológica, mas é também um fato histórico. Os discípulos de Jesus eram aqueles que frequentavam a reunião semanal para ouvir a Palavra, louvar a Deus, encerrando essa reunião com a ceia eucarística. Assim eram conhecidos e se chamavam de “ECLESÍA”, ou seja, o grupo da reunião/assembleia convocada por Cristo. É na participação para a celebração da ceia que se realiza em plenitude a essência da Igreja.
A Igreja se expandiu, se impôs como religião no Império Romano e no mundo. Ao mesmo tempo, foi criando normas e padronizando a celebração eucarística, de modo que, hoje, em qualquer lugar que um católico for, encontrará uma celebração que ele entenderá mesmo que seja celebrada em língua estrangeira. Esse padrão universal traz a vantagem de o católico se identificar como católico e poder participar de uma celebração eucarística em qualquer lugar do mundo.
Mas vamos repetir: A IGREJA SE CONSTRÓI NA CEIA EUCARÍSTICA.
Essa afirmação que é um princípio eclesiológico fundamental acabou se tornando uma fórmula abstrata, envolvida por várias reflexões teóricas que esvaziam seu significado existencial.
Então, retomando o sentido original, temos que entender que a reunião dos cristãos se realizava realmente como uma refeição, como um encontro semanal de uma família. Era um grupo constante que se encontrava e assim criava vínculos entre aqueles que compartilhavam da mesma fé. Sem dúvida, havia diferenças, divergências e até brigas como em qualquer família. Mas não trocavam de família por causa disso. Iam procurando se entender e se acertar alimentados pela Palavra de Deus e pelo Alimento do Senhor. Assim eram uma comunidade-família.
Ao longo do tempo, esse “espírito familiar” foi se perdendo e “ir à missa” passou a ser apenas um dever religioso. Quer dizer: a pessoa vai à igreja, assiste à missa, comunga e vai embora pra casa com a sensação de “dever cumprido”.
Assim sendo, a ideia de SER IGREJA não tem mais sentido. O católico vai à missa em qualquer igreja e tudo bem, pois o importante é cumprir o dever dominical. Por isso, vemos católicos que vão cada domingo numa igreja, ou no Convento da Penha (estamos no Espírito Santo). Assim eles podem avaliar as missas como: “muito bonita”, “emocionante”, “chata”, “cansativa”. Ou seja é como uma plateia comentando uma peça teatral.
Há também aqueles que vão à missa “dependendo do padre”, alguns chegam a ser seguidores do padre: só assistem à missa daquele padre.
Existem os que não vão à missa se souber que determinado grupo ou pessoa vai atuar ou só vão quando seu grupo ou equipe é que vai servir na celebração.
Poderia citar vários outros exemplos desse comportamento que, talvez, se pudesse chamar de “cristão genérico”. Todos são sintomas de uma igreja que perdeu seu espírito comunitário-familiar.
Antes do Concílio Vaticano II, essa atitude era quase generalizada. Após o Concílio, que estimulou a participação dos leigos e, principalmente, com o surgimento das Comunidades de Base recuperou-se muito o sentido comunitário-familiar da Igreja. As pessoas passaram a buscar ter atuação mais consciente na comunidade. Começaram a se chamar realmente de “comunidade”. As pessoas passaram a se conhecer, a saber dos problemas uns dos outros e a buscar formas de participar e de melhor contribuir para o crescimento da comunidade e pela transformação da sociedade.
Aqui no Espírito Santo, que já foi uma referência nacional em relação às Comunidades de Base, muito dessa força que elas tinham se perdeu. Entretanto, ainda vemos em muitas comunidades católicas esse espírito comunitário. Há católicos que ainda sentem e vivem a importância do vínculo comunitário-familiar, participando com fidelidade das celebrações em suas comunidades e contribuindo para aperfeiçoar essa comunidade.
Enfim, o que quero destacar é que a plenitude da experiência cristã, no sentido de SER IGREJA, se dá quando o cristão convive numa comunidade participando da eucaristia semanal nessa comunidade. É como uma família. A refeição em comum, ao menos uma vez por semana, é fundamental para a conservação do espírito familiar. Se você vai só de vez em quando, você é visita. Se você vai só quando tem que fazer alguma coisa, você é um funcionário. Se você vai somente quando vão os irmãos de que você gosta, a família não é um valor para você.
Portanto, precisamos recuperar esse espírito familiar-comunitário, em que os cristãos se assumem como membros de uma Igreja concreta, viva, pessoal. Isso só é possível se a gente convive e concelebra numa comunidade concreta em que passamos a nos sentir como membros de uma família.