COMUNISTÃO
Dia desses, alguém me perguntou:
- Você é comunista?
Sei que, neste país, as pessoas não têm a menor ideia do que seja comunismo. Talvez seja um dos poucos países do mundo em que, quando se quer xingar um adversário político, se xinga de “comunista”, como aliás, xingaram até o STF. Principalmente nos dias atuais, qualquer pessoa que discorde ou critique o presidente é tachada de “comunista”.
Por isso, a resposta pode não ser simples.
Começo esclarecendo que não sou comunista no sentido leninista, estalinista, maoísta ou qualquer coisa parecida com isso.
Na verdade, eu me esforço para ser comunista como Jesus era.
Imagino que você, leitor, está provavelmente assustado. Está pensando aí: que heresia! Chamar de Jesus de comunista! Como pode?
Então, vamos lá.
Você conhece algum dito de Jesus em que ele defenda a propriedade privada?
Lembra de algum momento em que Jesus diz que os ricos é que são bem-aventurados ou que ser rico é uma bênção de Deus? Pelo contrário, Jesus sempre fala que os pobres é que são felizes porque Deus olha por eles e que o Reino de Deus é para eles. Quanto aos ricos, ele diz o contrário: “ai deles, já receberam sua recompensa”.
Jesus sempre fala em partilhar, em dividir. Até diz até que dificilmente um rico entrará no Reino de Deus. Em outro momento diz que os ricos até podem entrar se ajudarem os necessitados com suas “riquezas injustas” e estes intercederão por eles.
A ideia de comunhão e de partilha está presente o tempo todo nos evangelhos. Tanto assim que os primeiros cristãos tinham tudo em comum e ninguém considerava seu o que era seu, todos colocavam tudo a serviço da comunidade.
Como todos sabem, a palavra “comunismo” vem exatamente dessa ideia de ter as coisas em comum e é parente das palavras “comunidade” e “comunhão”. Os primeiros cristãos praticavam um comunismo simples e real, por opção, de modo que todos os que tinham mais bens entregavam tudo aos apóstolos que administravam isso de modo a não faltar nada para ninguém. Infelizmente, essa experiência acabou, pois a estrutura social da época (como a de hoje) não dava condições para que esse tipo de convivência fosse em frente.
O problema dos chamados “regimes comunistas” que aconteceram na história é que eles tentaram fazer isso acontecer na base da força, da violência e se tornaram ditaduras e, como tais, acabaram criando grupos de privilegiados. Na verdade, não é possível forçar as pessoas a sair do egoísmo, a superar a ganância, a querer ter cada vez mais para si.
Na mensagem de Jesus, nada pode ser feito à base de força. Depende sempre de que as pessoas aceitem, assumam de livre e espontânea vontade o compromisso de partilhar, de dividir, de apoiar uns aos outros. Se não for assim, nunca vai dar certo.
Por isso, é que digo que estou me esforçando para ser comunista igual a Jesus. Ou seja, deixar de ser egoísta, parar de pensar só em mim mesmo, achando que o que é meu é só meu. Numa formulação positiva: começar a me tornar mais solidário, a compartilhar com os mais necessitados e assim por diante.
A construção desse “comunismo de Jesus” é um longo processo pessoal e coletivo de transformação do mundo e de conversão pessoal.
Então, ao mesmo tempo em que, como cristãos, devemos anunciar a mensagem de amor, solidariedade e partilha, devemos buscar construir um tipo de sociedade que crie condições para que essa partilha seja possível, para não acontecer como aconteceu com os primeiros cristãos. Precisamos construir uma estrutura social que proporcione igualdade verdadeira, e não apenas formal, entre as pessoas, de modo que todos tenham condições de viver dignamente, uma sociedade em que não haja miseráveis, famintos, excluídos e em que os mais ricos e poderosos saibam que têm colocar seus bens a serviço do bem comum.
É nesse sentido que sou comunista, isto é, sou um comunista-cristão, ou, juntando as palavras, sou um comunistão.